CLICHÊS E MARCAS DE ORALIDADE
CLICHÊS E MARCAS DE ORALIDADE
NÃO SÃO DO BEM EM DISSERTAÇÃO
“Nos dias de hoje, o problema
da saúde é uma das questões mais importantes para o povo brasileiro. A
população precisa se conscientizar de seu papel na busca por um futuro melhor
para as próximas gerações. Apesar do estado precário dos hospitais do país, os
governantes corruptos não se mobilizam e só o que se vê é descaso. Mas deve-se
pensar positivo, porque a esperança é a última que morre.”
Esse parágrafo parece um pouco
familiar? Será que você já leu algo parecido antes? Sim, com certeza! E,
provavelmente, já escreveu algum texto com um conteúdo semelhante. Vou me
explicar melhor: esse pequeno trecho está recheado com o que chamamos de
clichês, senso comum, chavões ou frases prontas. São frases ou ideias tomadas
como “verdades universais”, muito repetidas ao longo dos anos, que acabam se
tornando vícios de linguagem. Às vezes, usamos sem perceber, mas os clichês
enfraquecem o texto. Um verdadeiro vírus da redação!
Os
clichês do parágrafo acima:
-Nos dias de hoje;
-A população precisa se conscientizar;
-Futuro melhor para as próximas gerações;
-Governantes corruptos;
-Pensar positivo;
-A esperança é a última que morre.
-A população precisa se conscientizar;
-Futuro melhor para as próximas gerações;
-Governantes corruptos;
-Pensar positivo;
-A esperança é a última que morre.
O
clichê pode se manifestar de várias maneiras. Veja:
1. Frases prontas: são as frases e construções
repetidas à exaustão. Exemplos:
fechar com chave de ouro, obra faraônica, voltar à estaca zero, era uma vez.
Também são incluídos os ditos populares, como “a pressa é inimiga da
perfeição”.
2. Expressões: Não necessariamente são escritas
sempre do mesmo modo, mas a ideia é sempre a mesma. Exemplos: a população precisa ser conscientizada, a natureza deve
ser preservada, o homem deve parar de fazer guerras.
3. Senso comum: são as ideias prontas, já muito
batidas, mas transmitidas como verdade incontestável. Entram aqui os estereótipos. Exemplo: “todos os políticos são corruptos”, “asiáticos são
inteligentes”. É preciso ficar atento, porque às vezes o senso comum e a generalização
podem reproduzir preconceitos: “muçulmanos são terroristas”, “portugueses
são burros”, “mulheres dirigem mal”.
Mas por que usar esse tipo de frase é
prejudicial para o seu texto? Porque a banca corretora preza pela originalidade
e pelo senso criativo do candidato.
O uso dos chavões deixa o texto vazio, com pouco sentido, e demonstra falta de
habilidade do aluno em formular seu próprio argumento.
Quando digo que o clichê demonstra
falta de originalidade, não quero dizer que o candidato deva apresentar uma
ideia mirabolante. A originalidade em questão é ser capaz de pensar além do
senso comum, ser capaz de problematizar
o tema da redação e apresentar um novo ponto de vista sobre aquele assunto.
Vou dar um exemplo utilizando o tema
da redação do Enem de 2001, que pedia que o aluno escrevesse um texto sobre o
conflito entre o desenvolvimento e a preservação ambiental, e como conciliar os
dois interesses. Neste texto, o aluno que escreva “é preciso conscientizar a
população”, ou “o governo deve encontrar outras formas de desenvolvimento que
não envolva o desmatamento” não está acrescentando nada de novo no debate. É
claro que a população deve ser conscientizada e o desmatamento deve ser evitado
ao máximo, mas esses pensamentos já se tornaram óbvios.
O que um bom texto faz é trazer o
debate para outro ângulo, uma nova perspectiva. Mas como fazer isso? É preciso
manter-se bem informado e ter bastante repertório cultural. Conhecer diferentes
opiniões, especialmente sobre os assuntos mais comentados nos noticiários. Além
disso, boa interpretação de texto é essencial, porque a própria coletânea da proposta de redação
costuma ser bastante abrangente.
MARCAS
DE ORALIDADE
É uma tendência comum colocarmos em
nosso discurso escrito aquilo que cotidianamente proferimos — as marcas de
oralidade. É o caso, por exemplo, de expressões coloquiais como “fulano não é flor que se cheire”.
Mas, afinal, o que significa não ser
“flor que cheire”? Essa expressão é um tanto abstrata e pode não ser adequada
para certos gêneros textuais.
Por isso é tão importante que você
entenda, de fato, o que são as marcas de oralidade, por que elas não são
adequadas a determinadas situações e como evitá-las em suas redações.
As marcas de oralidade nada mais são do
que traços
das nossas falas cotidianas que
podem aparecer em nossos textos. Gírias,expressões comuns em diálogos (como:
“né?”, “tá”, “viu?”), ditados regionalistas, dentre outros, são bastante
presentes em nossas conversas do dia a dia, mas não se encaixam nas normas
cultas da língua portuguesa.
Tratam-se de palavras e expressões
utilizadas de modo pessoal e que, muitas vezes, possuem significados subjetivos
que não podem ser compreendidos por quem não mora em determinada região, por
exemplo.
Portanto, podemos entender as marcas de
oralidade como transcrições de nossas
falas cotidianas. Elas são muito comuns em crônicas e contos, por exemplo,
onde os autores trabalham diálogos entre os personagens e com o próprio leitor
ao longo do texto.
Por que evitar as marcas de oralidade?
Em alguns tipos de redação, as marcas
de oralidade são bem-vindas e até necessárias para transmitir o que o autor
está querendo dizer. Como você já pôde ver, é o caso da crônica, por exemplo,
um tipo de texto mais pessoal, em que é comum encontrarmos um autor que busca
dialogar com o seu leitor.
Porém, algumas situações e gêneros
textuais exigem que as marcas de oralidade sejam evitadas. É o caso da redação dissertativa-argumentativa exigida no Enem e em outros
vestibulares, por exemplo.
Além de demonstrar que você não
compreende que se trata de um gênero que deve ser escrito de modo impessoal, as
marcas de oralidade nesse tipo de redação apontam uma falta de conhecimento
sobre as normas cultas da língua portuguesa. Sendo
assim, você poderá ter a sua pontuação prejudicada caso não tome cuidado com
certas palavras e expressões.
Você não pode pressupor que o leitor
(que, neste caso, é universal) compreenderá determinados modismos da língua
falada. É por isso que se espera, do candidato de provas como o Enem, a
adequação do texto aos moldes da norma padrão, a qual grande parte da população
tem acesso e entendimento.
Como evitar marcas de oralidade na redação?
1. Fuja das interjeições
As
interjeições expressam sentimentos
e emoções por meio das palavras,
justamente as características que são inadequadas ao gênero
dissertativo-argumentativo.
Por
isso, evite demonstrar ao leitor que você sente alegria, alívio, desejo ou
reprovação por algo. Descarte, inclusive, palavras que denotam sentimento, como
“infelizmente”, “dolorosamente”, ou generalizações, como “inegavelmente” e
“definitivamente”.
Aquilo
que é uma lástima para você, doloroso demais, que não se pode negar ou que é
definitivo, pode não ser para outra pessoa. Você pode mostrar o seu ponto de
vista através da sua tese e de uma boa argumentação, o que ainda trará
credibilidade para a sua redação.
2. Não use verbos no modo imperativo
Nos
textos dissertativos-argumentativos, é inadequado conversar diretamente com
o leitor.
Nesse
caso, o imperativo verbal não deve ser utilizado, já que expressa o desejo ou
ordem do interlocutor ao cumprimento de uma ação, um pedido, um convite ou uma
súplica.
Como
já apontamos, seu papel é convencer o leitor com seus argumentos, não exprimindo o comando de
uma ação. Dessa forma, observe a conjugação verbal na hora de escrever e não
dialogue com o leitor diretamente.
3. Evite expressões coloquiais
Ao
conversar com amigos, geralmente usamos algumas expressões abstratas para
representar um pensamento. Consequentemente, às vezes reproduzimos isso na
escrita.
Essa
também é uma das marcas de oralidade que devem ser evitadas! Por isso, comece a
praticar a tentativa de transformar essas expressões informais em colocações claras, concretas e
formais.
Veja
os exemplos:
- você pode trocar o “não é flor que se
cheire” por “não é confiável ou honesto”;
- ao invés de falar que algo “pegou mal”,
você pode falar que algo “passou uma impressão errada, gerou embaraço ou
foi desagradáve”l;
- “deixar rolar” pode ser trocado por
“permitir que continue acontecendo”, “não impedir que tome seu curso
natural;
- “pegar no pé” quer dizer “importunar, ser
insistente”;
- ter um “ganha pão” é o mesmo que “ter uma
renda fixa, uma forma de sustento”;
- “quebrar um galho” diz sobre “um
improviso para resolver uma situação”.
PRATICANDO – CLICHÊS, FRASES FEITAS,
MODISMOS
Nas frases abaixo, estão destacadas palavras e expressões
cujo uso deve ser evitado numa dissertação. Trata-se de “modismos” e “frases
feitas”, indicadores de pobreza vocabular de quem escreve. Procure
substituí-las por palavras adequadas, reconstruindo a frase, se preciso, mas sem modificar o seu
sentido. Observe que , em alguns casos,
pode-se simplesmente eliminar a palavra ou expressão destacadas. A primeira já
está respondida como modelo.
1)
A nível de revelação
de novos talentos, o São Paulo está a todo vapor.
RESPOSTA POSSÍVEL
(MODELO): Sempre preocupado em
renovar sua equipe, o São Paulo tem investido na formação e na revelação de
novos jogadores.
2)
O psicólogo quis colocar uma questão. Para ele, é
necessário permitir que os jovens conquistem
seu espaço.
3)
Foi chocante: sabendo administrar o resultado do jogo
de ontem, o Brasil carimbou seu
passaporte para as semifinais do torneio de consolação.
4)
A posição do ministro
entrou em rota de colisão com as
ideias da liderança sindical.
5)
Os traficantes devem
ser severamente penalizados pela
lei.
6)
A nível de prestação
para os exames, pode-se sentir firmeza naqueles
que, desde o começo do ano, saíram em
busca do prejuízo.
7)
Agarrei-me à certeza de que, àquela hora,
o estacionamento estaria literalmente
tomado.
8)
A indústria de
informática está ensaiando seus
primeiros passos em direção ao futuro.
9)
Após acalorada discussão, seguida de intensa pancadaria, o jogador e o juiz
foram encaminhados ao hospital com escoriações
generalizadas.
10) O
doutor Sizenando Peixoto, que dispensa
apresentações, discorreu longamente sobre o tema da corrupção, dirimindo as dúvidas que eventualmente
surgiram.
11)Um lamentável acidente fez com que perdêssemos o bonde da história. Parece
que o destino nos quer tratar com requintes
de crueldade.
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